Ela se foi...

Era madrugada e ela não conseguia dormir... depois de horas de conversas, lembranças de pessoas e experiências que viveu, ela teve fome, fomos para a cozinha e rapidamente estava pronto o prato mingau de aveia. Entre uma colherada e outra ela me olhou e me fez uma pergunta complexa para responder a alguém que estava partindo tão rapidamente...

- Jossiana, meu mundo está de cabeça para baixo, porque isto está acontecendo comigo?
Aquele olhar e aquelas palavras me emudeceram, afinal tratava-se de alguém que eu amava e fazia parte da minha vida desde a infância.
- Dona Maria, eu gostaria de ter esta resposta mas eu não tenho, mas a senhora sempre demonstrou tanta força durante a sua vida, já superou tantas dificuldades, já ajudou a tantas pessoas, vai conseguir passar por esse momento também, e depois saberá responder, por enquanto  procura trazer na memória as coisas que lhe dão esperança, como a presença de Deus por exemplo, Ele estará com a senhora todos momentos e te dará força e coragem. Foi tudo o que consegui dizer. Oramos e li a pedido dela o salmo 42, fomos para o quarto e ela dormiu. ( esse salmo ela pediu pra ler inúmeras vezes nos dias que se seguiram)

O tempo passou e ela se foi... mas aquele olhar e aquelas palavras ainda ressoam a minha mente...
Talvez porque eu não tenha dito tudo o que eu gostaria de dizer, talvez tenha me faltado coragem para dizer o que precisava ser dito, ou talvez porque eu estivesse assustada com o fato de que alguém tão cheia de vida, tão saudável, com tanta sede de viver estava indo embora tão depressa...normalmente eu me arrependo pelo que eu digo, mas desta vez eu me arrependi pelo que eu não disse.

Naquele momento eu queria abraçá-la bem apertado e ter dito o quanto eu a amava e estava triste pelo fato dela estar enfrentando um câncer mas que eu acreditava que Deus é soberano sobre todos os acontecimentos da vida dela inclusive a doença e Ele iria sustentá-la;
Eu queria ter dito que ela era uma das mulheres mais fortes e trabalhadoras que já conheci, e as vezes eu tinha até vergonha do tanto que ela trabalhava e eu não conseguia acompanhar seu ritmo.
Eu queria ter dito que que ela era uma mulher de coragem e eu nunca a vi fugir de lutar pelo que acreditava, e que aquele era o momento de continuar lutando.
Eu queria ter dito que ela era admirável pela família que construiu, pela história que viveu, pelo caráter inquestionável, e que procurou andar com Deus todos os dias da sua vida.
Eu queria ter dito que se há algum privilégio para o cristão na doença, esse privilégio consistia na aproximação do Senhor e a plena certeza do conforto do Espírito Santo, e isso ela tinha, era só desfrutar.
Não disse também que nós não temos nenhum controle sobre o tempo da nossa vida, pessoas são levadas daqui na infância, adolescência ou na velhice, doentes ou não, isso é não está no nosso controle, por isso, todos nós devemos estar preparados, em comunhão com Deus e poder dizer como o apóstolo Paulo: combati o bom combate, completei a carreira e guardei a fé...
Era o que eu queria ter dito...

Tudo passa tão depressa, nunca devemos deixar para amanhã aquele muito obrigada, ... eu te amo, ...você é importante pra mim, ...  Te admiro muito, admiro seu trabalho, você é muito especial, ... nunca deveríamos desviar os olhos daqueles que nos são queridos em função de um passa tempo fútil porque amanhã, bem amanhã não conseguimos fazer nada, só hoje, só agora, nesse minuto.